Duas versões delirantes da direita burra sobre os médicos cubanos e uma suspeita
1. O médico cubano malvado: Fidel Castro e Dilma Rousseff estão planejando fazer uma revolução comunista no Brasil em pleno século 21, liderada pelos 4 mil médicos que virão ao País. Ao chegar às cidades do interior, os médicos cubanos imediatamente convencerão as pessoas mais humildes a se juntar a eles para discutir o marxismo fora do expediente. (!?!)
Dentro das cadernetas de vacinação das crianças, os médicos ocultarão exemplares de O Capital (2.500 páginas, mas isso é um detalhe) e do Mini-Manual do Guerrilheiro Urbano de Carlos Marighella. Lavradores esconderão coquetéis molotov entre as mandiocas de sua plantação para serem usados na hora em que o povo tomar o poder. Entre uma consulta e outra, os médicos cubanos irão fazer lavagem cerebral nas donas-de-casa que levaram até lá seus filhos pequenos com febre e que antes eram tratados pelos atendentes das farmácias, porque os médicos brasileiros se recusavam a trabalhar ali.
Depois de plantar a semente do comunismo nos rincões, os médicos marcharão junto com os recém-convertidos até as grandes cidades com o apoio do governo federal, acabarão com todos os partidos e todos os jornais e emissoras de televisão e então instalarão o comunismo no Brasil. O Exército assistirá a tudo sem fazer nada porque está sucateado e nem armas possui.
Os fatos: só uma pessoa imbecil pode acreditar num conto da carochinha desses, eu nem vou rebater.
2. O médico cubano coitadinho: o governo federal vai importar 4 mil médicos de Cuba para mantê-los escravizados em cidades do interior do País. Os médicos não terão acesso à internet nem à televisão. De vez em quando, poderão escutar rádio, mas apenas músicas da Nova Brasil FM.
Só poderão sair de casa para atender os pacientes, mas estarão proibidos de falar com os brasileiros qualquer coisa além de “dói onde?” ou “diga 33″. Haverá vigilância permanente sobre os cubanos para que não queiram conhecer o estilo de vida daqui, o que poderia alimentar neles o desejo de desertar.
Todos receberão menos que um salário mínimo e só poderão comer o que comiam em Cuba: pão e água. Dormirão em alojamentos do Exército cercados com arames farpados e com câmeras de segurança vigilando inclusive durante a madrugada. Como chegaram maltrapilhos ao Brasil (afinal, em Cuba passam até fome), usarão jalecos doados pelos compreensivos colegas brasileiros, graças a uma campanha feita pelo Conselho Federal de Medicina.
Os fatos: segundo o governo, os médicos ganharão até 4 mil reais para viverem no Brasil, a depender do custo de vida das cidades para onde serão destinados. 74% deles irão para cidades do interior do Norte e Nordeste onde não há médicos porque nossos compatriotas de branco simplesmente não querem morar ali.
Os primeiros 400 profissionais que já estão chegando irão para 701 municípios que não foram escolhidos por nenhum médico brasileiro que se inscreveu para o programa. Terão previdência paga pelo governo federal e alimentação e moradia arcadas pelos governos municipais.
Os primeiros 400 profissionais que já estão chegando irão para 701 municípios que não foram escolhidos por nenhum médico brasileiro que se inscreveu para o programa. Terão previdência paga pelo governo federal e alimentação e moradia arcadas pelos governos municipais.
Mais importante: se houver qualquer problema em sua estada no Brasil, todo mundo irá saber, porque hoje, com a internet, é praticamente impossível uma denúncia deixar de ser feita até mesmo em Cuba –que o diga a blogueira Yoani Sanchez.
Os cubanos são médicos, não robôs. Eles falam! E saberão criticar os problemas que encontrarem. Estarão livres para isso.
A SUSPEITA: Fiquei pensando no porquê de tanta rejeição das associações médicas brasileiras aos colegas cubanos.
Não se vê tanta ojeriza quando se fala que o Brasil também importará médicos de Portugal e Espanha. Por que, afinal, os médicos de Cuba são tão criticados? Existirá alguma razão além do corporativismo para o rechaço?
Ora, a medicina cubana é reconhecida mundialmente por ser preventiva. Ou seja, por fazer o possível para impedir que a pessoa adoeça. O que isto significa? Que em Cuba, ao contrário do Brasil, se usam menos remédios. Isso tem se mostrado positivo.
Hoje a ilha consegue superar até mesmo os Estados Unidos (ohhh!) na taxa de mortalidade infantil: enquanto na terra de Obama morrem 5,9 crianças a cada mil nascidos vivos, na terra de Fidel e Raul o número é de 4,7 por mil –no Brasil a taxa é quase quatro vezes maior, 16,7 por mil, embora tenha caído muito nos últimos anos.
Será que, na verdade, o que as associações médicas brasileiras temem é que chegue ao Brasil, com os cubanos, uma nova forma de praticar medicina que não a exercitada por eles aqui, uma parceria –praticamente um conluio– com os grandes laboratórios farmacêuticos?
Três anos atrás, o CFM (Conselho Federal de Medicina), que agora grita contra os cubanos, desistiu de proibir as escandalosas viagens de médicos brasileiros (leia aqui) financiadas pelos laboratórios multinacionais produtores dos remédios que eles receitam a rodo para a população.
Você sabia disso?
Será que o medo real do CFM não é que os cubanos tragam uma, essa sim, revolução? Uma revolução contra o excesso de medicamentos que o Brasil consome, por culpa não dos médicos cubanos, mas dos mesmos profissionais brasileiros que se recusam a atender a população do interior? Fica a pergunta.
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