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quarta-feira, 6 de setembro de 2017

Por uma "Democracia Cognitiva"




“A ética para si pode ser definida como resistência à nossa barbárie interior. Nenhuma civilização pôde reduzir a barbárie interior dos seres humanos. A civilização ocidental negligenciou o interior para se voltar na direção do exterior. Traços de barbárie particularmente ligados ao individualismo (egocentrismo, autojustificação, etc.) desenvolveram-se e consolidaram-se em nosso psiquismo. Ora, é na crise atual de civilização que surgiu o apelo não somente à ética, mas também ao que se chama de maneira equívoca de espiritualidade, receitas vindas do Oriente, como yoga e zen, assim como psicoterapias diversas para remediar ao mal-estar interior.”

“Nossa civilização separa mais do que liga. Estamos em déficit de religação e esta se tornou uma necessidade vital. Não é somente complementar ao individualismo, mas também uma resposta às inquietações, incertezas e angústias da vida individual.”

“Não se trata de forma alguma de alcançar uma sociedade de harmonia na qual tudo seria paz. A ‘boa sociedade’ só pode ser uma sociedade complexa que abraçaria a diversidade, não eliminaria os antagonismos e as dificuldades de viver, e que comportaria mais religação, compreensão, consciência, solidariedade, responsabilidade... Será possível?”

“Todo conhecimento pode ser posto a serviço da manipulação, mas o pensamento complexo conduz a uma ética da solidariedade e da não-coerção. Como indiquei, ‘podemos imaginar que uma ciência que traga possibilidades de autoconhecimento, abra-se para a solidariedade cósmica, não desintegre o rosto dos seres e dos entes, reconheça o mistério em todas as coisas, poderia estabelecer um princípio de ação que não ordene, mas organize, não manipule, mas comunique, não dirija, mas estimule.”

“O pensamento complexo alimenta a ética. Ao religar os conhecimentos, orienta para a religação entre os seres humanos. O seu princípio de não-separação orienta para a solidariedade.”

“O problema da ciência vai além dos cientistas. Clemenceau dizia que a ‘guerra é um negócio sério demais para ser deixado nas mãos dos militares’. A ciência é um assunto sério demais para ser deixado unicamente nas mãos dos cientistas. Sabemos também que a ciência se tornou perigosa demais para ser deixada nas mãos dos homens de Estado. Em outras palavras, a ciência tronou-se também um problema cívico, um problema de cidadãos. Mas estes ignoram cada vez mais um saber que lhes é incompreensível, pois esotérico. Daí a necessidade e a dificuldade de uma ‘democracia cognitiva’.”

Edgar Morin

Fonte: Philippe Bandeira de Mello (Facebook)

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